Re: [Profs Mat:7498] A Partida de Tênis

Lembrei-me, com o texto abaixo (que, como o colega J. Cássio,
endosso totalmente!), de um comentário de Rubem Alves que
dizia sempre preferir o assim chamado frescobol ao tênis. Porque,
no frescobol você precisa do acerto do outro para continuar a jogar.
E a divertir-se. Isto é apenas outro modo de se reafirmar o '44'
de Carlos Mathias. Mesmo no tênis, que graça tem um 'ace'?
Abraço p'ros de abraço, beijos p'ras de beijo e vamos dar um passo
cada direção. É nosso desafio imediato...
Joni


> Muito bom!! há muito tempo não usava a expressão: "falou e disse"!
> abraços
> J.Cássio
>
>
>
> Em 29 de novembro de 2013 19:17, Leo Akio <leoakyo@yahoo.com.br> escreveu:
>
>> A Partida de Tênis (Texto de Carlos Mathias - Jornal Dá Licença 54, pg. 14
>> - UFF)
>> http://www.uff.br/dalicenca/images/stories/jornais/jornal54novo.pdf
>>
>> Ainda hoje ouço os ecos de uma grande discussão envolvendo os "matemáticos
>> puros" e os "educadores matemáticos", cujo auge se deu na década de 90 do
>> século passado. Tais ecos ainda reverberam, nos dias de hoje, com muita
>> persistência. No Brasil, há uma grande desarticulação entre as práticas
>> curriculares que reúnem saberes "específicos" e saberes "pedagógicos",
>> particularmente no que se refere aos cursos de formação de professores
>> (Licenciaturas, Normal, Normal Superior, etc.). Muitos cursos de
>> Licenciatura preservam o antigo modelo 3+1, disfarçadamente. Por isso, tal
>> dicotomia sobrevive, enquanto causa e consequência.
>>
>> Uma reclamação que constantemente ouço dos alunos que cursam a
>> Licenciatura em Matemática, em todo Brasil, se coloca exatamente sobre a
>> falta de articulação entre as disciplinas cursadas e o trabalho que
>> desempenharão nas escolas. Algumas são exageradas e equivocadas, na minha
>> forma de ver, mas são totalmente justificáveis, diante da pouca experiência
>> profissional de quem as profere. No entanto, outras são extremamente justas
>> e nos serviriam muito bem como balizadores de uma futura reforma curricular.
>>
>> Há aquele ditado popular, sobre o "8 ou 80", que me parece ser bastante
>> aplicável a diversas situações vividas no meio acadêmico, terra fértil para
>> os discursos fundamentalistas, que são incapazes de construírem algo
>> concreto que nos permita avançar. Metaforicamente, somos os espectadores de
>> uma partida de tênis, entre o 8 e o 80. Uma partida de tênis é uma boa
>> imagem, pois os espectadores movem apenas as suas cabeças, ao acompanharem
>> a bola verde, hipnotizados. Ouve-se com limpidez os gemidos do 8 e do 80,
>> ao darem suas raquetadas, e os ruídos irritantes das solas de seus tênis
>> quando correm, de um lado para o outro.
>>
>> No primeiro game, do primeiro set, o serviço é do 8.
>> (8): Saque: "Educação Matemática é para quem não sabe Matemática".
>> (80) Rebatida: "Matemático puro não tem namorada".
>> (8) Rebatida: "Educador matemático dá aula brincando de canudinho e
>> massinha".
>> (80) Rebatida: "Ensinar análise real para quem dará aula no Ensino
>> Fundamental...para quê?"
>> (8) Rebatida: "O mal do universo é causado pelos pedagogos, acabemos com
>> eles".
>> (80) Rebatida: "Lá vai o fulano, especialista em hiperquadrados
>> riemmanianos de curvatura negativa. Cheio de si, está indo para a Alemanha
>> conversar com as únicas 3 pessoas no mundo que, além dele, sabem o que é
>> aquilo".
>> Placar empatado (deuce): 40 – 40.
>> O jogo não avança: vantagem 8, deuce, vantagem 80, deuce... Um looping
>> infinito, capaz de dar inveja ao Z4.
>>
>> Sabem, sou fã do 44. Nesse momento, minha querida amiga Maria Emília
>> Barcellos, profunda conhecedora de ditados populares, me diria: cuidado
>> Mathias, gato em cima do muro toma pedrada dos dois lados. No caso da
>> partida de tênis, seria gato em cima da rede toma bolada dos dois lados.
>> Mas penso que uma forma bastante interessante, polida e educada de
>> livrar-nos desse Z4 tão angustiante se daria, justamente, por meio de uma
>> abordagem à rede. O 44. Lugar que, hoje, é ocupado pelo mito. Voltaremos a
>> ele.
>>
>> São fatos:
>>
>> Há educadores matemáticos que sabem matemática, alguns são, até, doutores
>> em matemática pura.
>>
>> Há matemáticos puros felizes com suas companheiras, ou companheiros.
>>
>> A Educação Matemática, assim como a "matemática pura" trata de assuntos
>> não triviais que, sim, em alguns momentos são abordados por meio de
>> materiais concretos (como canudos, cartolinas). Isso não é uma brincadeira
>> de criança: se um matemático puro (ou qualquer pessoa) tiver um filho que
>> nasça cego, que tenha dificuldades de aprendizagem/visualização em certos
>> termos, ou não, poderá se surpreender com os resultados de atividades
>> envolvendo tais materiais, que foram desenvolvidas em pesquisas tão
>> credenciadas quanto às suas próprias. Talvez até gaste metade do seu
>> salário em uma escola especializada, para que seu filho os manipule. Os
>> gregos manipulavam materiais e instrumentos concretos, mas ninguém fala mal
>> de Euclides, Eudoxo, ou Arquimedes.
>>
>> A análise real é um dos cursos mais fundamentais ao futuro professor de
>> matemática. Não por conta da nova perspectiva do rigor, mas sim pelo olhar
>> criterioso sobre os conjuntos que ambientam boa parte da matemática
>> construída na escola. Ainda que algum livro afirme que é irrelevante o que
>> um número real seja, há outros livros, com outros perfis, que estão
>> dispostos a encarar tal conceito, que é bastante espinhoso.
>> Historicamente, os cursos de pedagogia não possuem uma estrutura dedicada
>> à matemática e ao seu ensino. A matemática, assim como as Ciências, se
>> coloca em termos periféricos. Tal estrutura é um legado histórico, cujo
>> teor é desconhecido por muitos. Portanto, para rediscuti-la, precisamos,
>> antes, apreendê-la minimamente. Os maiores críticos dos "pedagogos" não
>> sabem nada de pedagogia. O mito é a fronteira entre o medo e o
>> desconhecido. O radicalismo se institui pelo mito, a essência da ignorância
>> e da insegurança. O mito é a rede da quadra de tênis.
>> O colega que foi para a Alemanha estudar hiperquadrados riemmanianos de
>> curvatura negativa está desempenhando sua tarefa: a expansão de suas
>> pesquisas. Há alguns anos atrás, pesquisas que, aos leigos, tinham nomes
>> "alienígenas" estão, hoje, nas máquinas de tomografia computadorizada e nos
>> instrumentos de previsão meteorológica.
>>
>> Tenho a clareza que será difícil livrar-nos dos mitos. Mas, talvez, com
>> reflexão, humildade e alguns reais gastos com bons livros, possamos chegar
>> a alguma situação do tipo "32 ou 56". Em um quadro menos extremo, a rede
>> (44) seria um mito mais fraco.
>>
>> Trocando em miúdos matemáticos: sendo 44 uma boa média, chegou a hora de
>> reduzirmos o desvio-padrão. Jogar ping-pong, talvez?
>>
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João Frederico C. A. Meyer
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