Debate sobre o futuro da Mata Atlântica marca encontro entre RMA e Ministra do
Meio Ambiente
O Bioma Mata Atlântica ocupou originalmente uma área de 1,4 milhão de Km2, ou
quase 15% do território brasileiro, e nesta área vivem hoje mais de 70% da sua
população. Desde 1992 a Rede de Organizações da Mata Atlântica - RMA, agrega 285
organizações ambientalistas espalhadas em 16 estados do país que lutam pela
conservação e restauração desta floresta e outros ambientes naturais associados,
considerada uma das cinco mais ricas e ameaçadas do planeta.
Desde a sua origem, em 1992, a Rede Mata Atlântica defendeu uma legislação mais
clara de proteção deste bioma, alertando sobre a importância da mesma para a vida
de muitas espécies da flora e da fauna nacional, bem como pelo valor paisagístico e
serviços ambientais como a produção de água para as cidades e zona rural, incluindo
indústrias, irrigação agrícola e abastecimento humano.
Em 2014, com 7% da sua vegetação original, a Mata Atlântica responde aos maus
tratos com um alerta e uma grande tragédia: secas e uma crise sem precedentes na
oferta de água em cidades como São Paulo, Belo Horizonte e Rio de Janeiro, as mais
populosas e desenvolvidas cidades do centro sul brasileiro. Segundo economistas, a
crise hídrica poderá afetar a evolução do PIB brasileiro em 2015, rebaixando-o em 2%.
Com o objetivo de estabelecer uma agenda nacional para a Mata Atlântica a
coordenação da Rede de ONGs da Mata Atlântica (RMA) reuniu-se no último dia 24 de
fevereiro com a Ministra do Meio Ambiente Izabella Teixeira, o deputado federal Nilto
Tatto, que mediou o encontro, e representantes de ONGs afiliadas da RMA. A reunião
foi idealizada em encontro de planejamento anual que a RMA realizou em dezembro
de 2014, e teve por objetivo cobrar resultados efetivos na proteção do bioma,
considerando todos os planos e as metas já construídas anteriormente, em conjunto
pela Sociedade Civil e o MMA.
"Esta agenda estrutural independe de pessoas e partidos, mas sim de uma defesa
consistente de medidas firmes de proteção, restauração, uso sustentável e ampliação
da consciência ambiental na sociedade brasileira, que devem ser implementadas com
uma agenda de longo prazo", expressa Rui Rocha, do Instituto Floresta Viva sobre a
importância da reunião.
Após apresentar os principais pontos da Carta de Iperó, originada do planejamento
estratégico da RMA, em dezembro de 2014, os representantes da rede ouviram o
posicionamento da ministra em relação aos principais desafios para o bioma, as
conquistas realizadas e as propostas de atuação futura e conjunta com a sociedade
civil.
O principal foco da Carta de Iperó está na meta de restauração de, ao menos, 30% da
área original da Mata Atlântica, hoje muito degradada, e foi levado ao Ministério o
questionamento sobre quais ações o governo possui para recuperar o bioma
ameaçado, onde vive a maioria da população brasileira e onde a crise hídrica surge
como principal consequência desta degradação do bioma.
Destacou-se ainda a necessidade de fixar um prazo limite para a conclusão da
consulta pública aberta para o Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa
(Planaveg), além da importância do plano estabelecer estratégias e metas prioritárias,
e de avanços no Cadastro Ambiental Rural (CAR), até o momento com poucos
registros e incentivos técnicos. E finalmente a importância dos Planos Municipais de
Mata Atlântica (PMMAs) e dos desafios financeiros e técnicos para os municípios
assumirem o financiamento de sua efetiva implementação, bem como os decorrentes
da descentralização nos processos de licenciamento ambiental. Foi salientado que
falta perspectiva para implementação dos PMMAs elaborados, o que se deve a não
regulamentação do Fundo para Restauração da Mata Atlântica.
Para a ministra Izabella Teixeira há uma série de desafios que impedem o avanço na
conservação e restauração do bioma. Confirmando o que a RMA descreve na carta de
Iperó, de que há uma negligência do governo federal com o meio ambiente, Izabella
diz que há uma grave crise no Sistema Nacional de Meio Ambiente (Sisnama), e este
não dialoga, por exemplo, com o Sistema Nacional de Recursos Hídricos; o Sistema
Florestal Brasileiro também possui dificuldade de funcionamento, pois não há
fiscalização nos Estados, que deveriam ter a maior responsabilidade neste caso, e
pouco diálogo com o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (Snuc).
Em sua fala houve destaque para a necessidade de construir um novo modelo de
governança onde os sistemas interajam e se conheçam, assim como uma nova
pactuação entre sociedade e governo para uma gestão sustentável. A sociedade
esperava que este fosse o papel do governo, porém, a prática tem sido outra, o
diálogo aberto e transparente tem sido cada vez uma raridade.
"A compensação ambiental também não tem funcionado como se esperava, apesar de
haver, hoje, cerca de 1 bilhão de reais de compensação sem aplicação, pois não
existe um procedimento claro para aplicação desses recursos. Hoje o MMA busca
legalizar esta aplicação", disse a ministra.
Como aspectos positivos, ela enfocou a aplicação de R$ 347 milhões para a execução
do CAR nos Estados e destacou que o INCRA se comprometeu em executar o
cadastro em 7,2 mil assentamentos rurais até dezembro de 2015. O Ministério do
Desenvolvimento Agrário também criou uma agência de ATER para apoio à
implementação do CAR. Segundo a ministra, há 40% de área agriculturável no país no
âmbito do CAR, incluindo pequenos, médios e grandes proprietários, e em breve será
veiculada uma campanha nacional para adesão ao cadastro.
Em relação às Unidades de Conservação (UCs), o assunto é sensível segundo ela,
pois o atual modelo de Áreas Protegidas não tem funcionado como planejado,
havendo muitas categorias de manejo, que tornam ainda mais difícil a gestão dessas
UCs. O ICMBio é de difícil administração e mesmo com o aumento de servidores no
MMA, por exemplo, seria necessária uma política de transferir os analistas ambientais
para as UCs situadas no interior do país.
Como propostas, Izabella lembrou que apesar de resistências do governador do Piauí
para criar uma Unidade de Conservação na região da Serra Vermelha, já há um plano
de manejo para a exploração da vegetação autorizado pelo Serviço Florestal
Brasileiro, o qual está sob questionamento na justiça federal, e que deveria haver
maior mobilização da sociedade no sentido de apoio à proposta de criação da UC.
Foi proposta por ela a criação de um Grupo de Trabalho com os presentes na reunião
para: rodadas de diálogos abordando o Planaveg e a restauração do bioma frente às
áreas de expansão agrícola; apoio do MMA à Semana da Mata Atlântica, enfocando
temas que precisem de avanço e debate público; criação de um programa para a
Mata Atlântica, como já existe para a Amazônia (ARPA - Programa Áreas Protegidas
da Amazônia), visando a gestão e implementação de UCs e mosaicos de áreas
protegidas.
Por outro lado, a RMA sente que houve um retrocesso na agenda de diálogo quando a
mídia divulga que a ministra solicitou a aprovação do PL 7735 ao senador Renan
Calheiros, ferindo os direitos dos povos tradicionais e de todos os segmentos que
lutam pelo aprimoramento da atual versão do PL aprovado na Câmara. Grandes
projetos de infraestrutura com licenciamento ambiental frágil também afetam a
credibilidade de agências ambientais como o IBAMA.
"Com a reunião, a RMA cumpriu seu papel de diálogo com a liderança ambiental do
governo brasileiro, mas reivindica que o governo tem de demonstrar efetivamente seu
compromisso com a conservação e restauração da natureza brasileira, incluindo ações
socioambientais para a sustentabilidade do país", afirma Beloyanis Bueno,
Coordenador Geral da RMA.
--
Coordenador Geral da Rede de Ongs da Mata Atlântica -RMA
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